A tirania dos especialistas


Uma das coisas mais significativas sobre a ciência, perfeitamente conhecível quando se estuda a sua história, é o fato de que teorias concorrentes podem discordar em seus relatos sobre o que existe em última instância e, ainda assim, responder igualmente bem por todas as evidências observacionais – esse é exatamente o motivo que leva o filósofo brasileiro Newton da Costa a formular a sua teoria da quase-verdade.

Em outras palavras, o que isso quer dizer é que do mero sucesso preditivo e explicativo de uma teoria não se segue, de maneira alguma, que ela é verdadeira. Mais ainda, o sucesso dos métodos da ciência em iluminar os aspectos da natureza suscetíveis de predição e controle simplesmente não implica que a natureza não possua outros aspectos. Outras abordagens do mesmo fenômeno.

Se esse já é o caso para teorias científicas mais consolidadas, o que dizer sobre aquelas que são embrionárias? Aquelas que explicam um fenômeno que está em vigor? Ora, simplesmente, até mesmo por uma questão de probabilidade, há grandes chances de que qualquer teoria científica sobre a novidade possa não ser verdadeira. Nem mesmo quase-verdadeira. Para uma teoria explicando os fenômenos, pode haver outras quinhentas, discordantes dela, explicando os fenômenos também. E está tudo bem. Essa é a natureza do conhecimento científico.

Agora, justamente por causa dessa natureza dialética, quando surgem “especialistas”, quase sempre na grande mídia, para justificar medidas políticas ou, sei lá eu!, explicar o porquê que você deveria parar de usar calças azuis, estamos diante de um “decreto ditatorial”, de uma “tirania dos especialistas”. Ora, parem com isso. Parem com “a ciência diz que” ou “seguimos a ciência”. A ciência não diz nada e não pode dizer nada sobre o que devemos fazer. Ela pode me informar que a urina é um ótimo condutor de eletricidade, mas não pode me dizer para não urinar ou para urinar em um fio de alta tensão. Parem com isso.

Retirem as suas máscaras e assumam de uma vez por todas os seus desejos orwellianos. Ciência não se faz por decreto. Tiranias sim.

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