Dentre as máximas socráticas, uma das minhas prediletas é a de que uma vida não examinada não merece ser vivida. Sócrates tem razão. De que vale viver sem examinar seriamente o que se vive? Ou mais ainda, como posso viver o que não sei? Quem vive? Pois essa é a vida não examinada. Não é o ser, mas uma aparência dele. Um conjunto de ações, de circunstâncias, de palavras, colocados de tal maneira que a pintura resultante é moderna. Uma abstração desprovida de forma.
Examinar a vida, ao contrário, é pintar dela um quadro de Rembrandt. Colocar em ordem admirável o conjunto de borrões. E para examiná-la, solidão. Solidão necessária. Examinar o que se vive e o que se conhece. Cada conhecimento adquirido não deve ser obtido apenas com a razão, mas, através do exame solitário, da maturação interior, incorporado. Assim, cria-se uma coerência interna que sustenta todo o resto. Firma-se a casa sobre a rocha e não sobre a areia.
Maturar esse conhecimento significa torná-lo íntimo a ponto de transformar o próprio ser. Ou seja, o modo de existência é informado pelo que se conhece. Assim, através desse relacionamento íntimo, desses longos diálogos internos, gradativamente, sou o que conheço e conheço o que sou. Os borrões começam a ganhar significado e forma.
Essa solidão é, acima de tudo, interioridade. Dessa forma, exige uma predisposição do eu pelo silêncio, pelo recolhimento. Com ela, os espaços ocos da alma são preenchidos. Aquilo que era frágil, estirado e sem vida torna-se firme, alçado e repleto de “anima”. A voz dessa alma, que agora diz “eu sou”, ressoa na eternidade e o seu eco permanece na História.